terça-feira, 25 de março de 2008

Nosso entrevistado: Roberto Moraes

"O campista quer um prefeito sem rabo preso...
e que ame o seu município"


O sorriso largo e a constante cordialidade podem esconder o tom contundente de suas críticas e o peso de suas opiniões. Dono do blog de maior repercussão na cidade de Campos dos Goytacazes-RJ, o engenheiro e professor Roberto Moraes, virou uma espécie de “pauteiro” da imprensa local, que sempre lhe consulta e/ou cita em diversos assuntos. Aos 49 anos de idade, o ex-diretor do CEFET (Centro Federal de Educação Tecnológica) ganhou notoriedade aos discutir o desenvolvimento regional, tendo inclusive publicado duas obras sobre o tema. Na recente crise política que abalou o município, nos grandes picos de tensão, seu nome foi citado pelo prefeito em exercício como um cidadão a ser consultado naquele momento de enorme instabilidade. Petista, candidato derrotado numa eleição para Alerj, não aceitou o convite para ingressar no governo provisório. Por que? Crítico e criticado pelo modelo atual de gestão pública, hoje recebe elogios do ex-governador Garotinho e se indispõe com companheiros do PT. Por que? Isto, e um pouco mais, o Urgente perguntou, por e-mail, ao nosso entrevistado: Roberto Moraes.



Urgente - O Blog do Roberto Moraes entrou na lista obrigatória de leituras diárias, pelo menos em Campos e entre os jornalistas da cidade. Hoje o blog registra a expressiva marca de mais 223 mil acessos, sendo 50 mil no último mês. O que percebo é que seus leitores não estão apenas atrás de suas opiniões, mas também atrás de novas informações, o que seu blog tem feito com muita competência. A sua rotina de engenheiro e professor permite tanta dedicação a este ofício? Como tem sido pautar a imprensa local?

Roberto Moraes -
Comecei o blog sem muitas pretensões em agosto de 2004. A condição de professor, pesquisador, estudioso, orientador de monografias e dissertações no Cefet torna obrigatório que se use a internet como fonte permanente de consulta e de troca com alunos e outros professores. A disposição e o interesse em repartir as informações que coletava e de debater sobre elas, o blog acabou sendo um caminho quase natural. No início, eram poucas visitas e quase nenhum comentário dos leitores. Depois o quadro foi se modificando. Neste processo, muitas pessoas passaram a colaborar mandando informações, fotos, filmes diretamente para o blog ou por e-mail. Insisti e alguns deles também se tornaram blogueiros. Com isso surgiu a rede e cada vez mais leitores porque os novos blogs trazem os seus contatos para este universo. Quanto a pautar a imprensa local é um fato interessante, porque o blog também se alimenta da mídia local, ao mesmo tempo em que a retroalimenta com novas informações e também com espaço para opiniões de gente abalizada nos diferentes assuntos, algo mais difícil de ser feito nos jornais. Os blogs terão ainda muito espaço para crescer. Eles naturalmente ocuparão, com o barateamento do preço do computador e do acesso à internet, espaços não só alternativos de informações e opiniões em parcelas maiores da população. Os blogs têm a vantagem da velocidade do rádio e a perenidade da imprensa escrita que mantém o que foi dito e com a vantagem adicional do espaço on-line para questionamentos, críticas e outras opiniões.

Urgente - Durante toda a recente crise na Prefeitura de Campos, o prefeito interino Roberto Henriques disse, na sua primeira coletiva, que tinha telefonado para o senhor e pedido sua ajuda na composição do novo governo. Até o ex-governador Anthony Garotinho tem citado o senhor – e as publicações de seu blog – como fonte para discutir os problemas da cidade. Duas perguntas: por que o senhor não aceitou o convite do prefeito Roberto Henriques para integrar o governo? O que significa esta aproximação de discurso com o grupo do ex-governador Anthony Garotinho?

Roberto Moraes
- Foi um fato curioso. Acompanhei pelo blog com ajuda de diversos colaboradores o 11 de março campista. Cinco minutos antes da PF chegar à casa de Mocaiber, por volta das seis e meia da manhã, passei por ali e quando estourou a notícia eu estava chegando à Macaé. De lá, fiz as primeiras postagens com notícias dos colaboradores. Voltei a Campos chegando por volta das dez horas já postando fotos e novos fatos. Cheguei a ter dificuldades para postagem em função do grande número de acessos simultâneos. O contador do blog apresentou problemas e mesmo assim registrou mais de seis mil acessos num único dia. Pois bem, durante o dia falando ao telefone, recebendo e-mails e ouvindo rádio e postando novas informações eu recebo o telefonema de Roberto, ao mesmo tempo em que a rádio dizia que ele estava chegando à sede da prefeitura. Ele diz que desejava falar urgente comigo ainda naquele dia. Pedi que deixasse para o dia seguinte e que primeiro tomasse posse e o pé da situação. Logo a seguir, ele disse na rádio que havia me convidado para uma conversa e eu resolvi confirmar no blog. Seria muito estranho que as pessoas, centenas que estavam acompanhando pelo blog continuassem a ouvir informações e minhas opiniões sem que eu comentasse sobre o telefonema. Era algo novo você falar da notícia e entrar nela ao mesmo tempo. Informei e pedi opiniões sobre o convite. Elas vieram nos mais diferentes sentidos. Continuei a dar informações e postar novos fatos e só no dia seguinte ouvi a proposta de Henriques junto com o professor Luciano D´Ângelo. Pedimos tempo para analisar a proposta dele que era para nós - e esse nós incluía também o professor José Luiz Vianna da Cruz - assumíssemos a área de Desenvolvimento Econômico, que incluiria desde a Secretaria de Indústria, Comércio e Turismo, à Codemca e o Fundecam. Ponderamos algumas dificuldades de ordem política que ele e nós poderíamos ter com o convite. Ele se mostrou disposto se aceitássemos a manter os secretários do PT que foram nomeados pelo prefeito afastado e ficamos de responder até o dia seguinte. O convite foi pessoal e, mesmo sendo dito que ele tinha caráter mais técnico que político, era evidente que tal questão traria desdobramentos partidários. Desta forma, depois de ouvir algumas pessoas tomamos uma decisão em consenso de que não devíamos assumir porque poderíamos trazer mais problemas que soluções, não só pelas questões partidárias locais, como as regionais entre o PT e o PMDB. Roberto, além de cordial e simpático, pareceu sincero no objetivo de tentar traçar um governo mais técnico e menos partidário e, por isso, resolvemos nos colocar à disposição, sem entrar no governo esperando sinalizações mais claras de independência e ruptura com um modelo de gestão que precisava ser superada, tanto em relação ao governo afastado, como os que ficaram para trás. O que você pode estar chamando de aproximação do discurso com o grupo do ex-governador Garotinho é quase que uma conseqüência natural, na medida em que eu, no blog e nas entrevistas em jornais e TVs, vinha seguida e permanentemente batendo na má gestão dos recursos dos royalties e na necessidade de uma intervenção, inclusive, criticando duramente as pessoas do PT de Campos que tinham defendido a entrada no governo, já cheio de denúncias, do então prefeito Mocaiber. No momento logo a seguir do estouro da operação Telhado de Vidro, que inclusive o blog chamou a atenção para este estranho nome da empresa de shows, é natural que as falas se aproximem sobre os questionamentos, embora com nuances e propostas bastantes diferentes de intervenção em termos de políticas públicas. Essa é o tipo da resposta que não fica boa para blogs, onde o ping-pong e as perguntas e respostas curtas são mais apropriadas, mas a culpa é do Rodrigo.

Urgente - O ex-governador Garotinho lhe enviou uma nota explicando as razões que o fizeram pedir um habeas corpus preventivo ao TRF, chamando-o inclusive de "Querido Roberto". O ex-governador faz isso porque teme a repercussão de seu blog ou porque não o quer como mais um inimigo? Volto ao assunto: esta cordialidade representa uma aproximação com o grupo de Garotinho?

Roberto Moraes - O ex-governador com a sua astúcia e faro de mídia já enxergou a importância dos blogs, especialmente na formação de opinião e na articulação política com os seus pares, além do poder de criar novas notícias. O que você chama de cordialidade eu prefiro chamar de estilo. O blog do Roberto Moraes guarda, como não poderia deixar de ser, a maneira de ser do seu autor, o de ser duro nas críticas e nos questionamentos, mas cordial no trato e nas relações pessoais. Embora o blog seja um espaço aberto, como qualquer reunião ou assembléia que permite a presença de todo o tipo de gente, até de pitbuls, a tendência é que quem queira uma interlocução se dirija ao blogueiro no estilo deste. O blog é um exercício de cidadania e de tolerância, porque com ele você se expõe. Expõe sua opinião, submete-se a críticas, também crítica, faz propostas, enfim dá a sua cara à tapa. Quem não quer ser criticado não se expõe.
Urgente - Nas últimas eleições, sejam nos inúmeros e excepcionais pleitos municipais de Campos, tanto quanto nas disputas estaduais, sempre houve uma espécie aliança branca para conter o crescimento do ex-governador Anthony Garotinho. O PT, principalmente, “interveio” em Campos no sentido de derrotar o grupo de Garotinho em sua terra natal. Sinceramente, o senhor acredita que vale tudo contra o garotismo? A atual situação de Campos não mostra que houve um erro estratégico no apoio ao governo Mocaiber?

Roberto Moraes -
Vou começar pelo final. Sem dúvidas que houve um erro estratégico, tático, político ou de qualquer outra natureza que você queira analisar. Não dava para compactuar e pensar em implementar políticas públicas sérias com um governo que, majoritariamente, só pensava em maracutaias com os milhões dos royalties. Pois agora, em termos partidários, não dá para rever isso, sem que aqueles dirigentes partidários façam uma profunda e radical autocrítica do erro que cometeram, em nome do partido e de pessoas que acreditavam na perspectiva de implantação de uma boa governança em Campos. Sobre a primeira pergunta é evidente que eu não posso aceitar aqueles que defendem um vale tudo contra o garotismo. É preciso uma nova forma de governar em que a boa política pública seja o norte. A maior dificuldade hoje de conviver com o Garotinho é o seu sonho desmesurado em subir na política. O campista quer um prefeito sem rabo preso com quem quer que seja e que goste, ame o seu município, e por ele possa criar as condições de usar bem o dinheiro dos royalties, hoje mais do que nunca ameaçados por maus governos, para que tenhamos um presente melhor que o passado e o presente com perspectivas de desenvolvimento, não só econômico, mas social e com cuidados ambientais.

Urgente - Campos sobreviverá sem royalties? Como?

Roberto Moraes -
Qualquer cidade e povo sobrevivem aos maiores desafios que se possa imaginar. Quanto mais um povo como o nosso, que vem enfrentando desafios seculares. A questão, porém, é como o governante do presente deve usar o dinheiro, considerando que em nenhuma hipótese teremos no futuro, mesmo que todo o dinheiro dos royalties possa ser bem investido, a receita que temos hoje. Sendo assim, ser criterioso em meio especialmente às demandas enormes e ainda não atendidas da comunidade nas áreas de habitação popular, educação, saúde e outras infra-estruturas é o grande desafio. Neste aspecto, tem-se que acabar com os esquemas que levaram os preços dos serviços e das obras executadas em Campos a preços estratosféricos, sem similaridades em outros municípios do país, nem mesmo nas capitais. A pouca vergonha que estava vigente em Campos chegou a fazer uma reforma de praça, ou um abrigo provisório de passageiros, feito com toldo, custarem ambos, individualmente, mais caro que a construção da Uned de Guarus, do Cefet Campos. Para isso, há necessidade de uma gestão, além de mais austera, também mais transparente, para que a população ajude a vigiar os absurdos. Tenho ouvido de empresários e empreiteiros o desejo de trabalhar honestamente, ganhando e perdendo licitações, tendo os seus lucros normais, mas sem necessidade de ter que dar 10, 20, 30 e dizem que até 50% dos valores que seriam das suas obras. Por fim, o gestor não pode deixar de ter uma visão mais solidária e humana da sua gestão, lembrando que é sempre a parte mais carente da população que precisa dos governos, sem populismo, mas com programas e políticas públicas que sejam, pelo menos, no médio prazo emancipatórios da indigência e da pobreza. Uma integração entre os municípios para a resolução de problemas regionais também são importantes na perspectiva de redução das fragilidades e do fortalecimento dos pontos fortes de cada município individualmente. Enfim, para isso é preciso mudar radicalmente o que aí temos. É hora de se fazer um “faxinão” nesta forma arcaica e superada de gerir uma cidade.
Fotos: arquivo
Foto1: Roberto em casa
Foto2: Roberto conversa com Lula e Luciano D'Angelo, no Cefet, em 1999

Um comentário:

Splanchnizomai abraçando o amanhã. disse...

Pittbul pode. Só não pode jumentinho... rsrs